Salessuir

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Goiás, Brazil
Com este nome dá para pensar que sou única, né? E sou,embora saiba que exista pelo menos uma outra salessuir por este mundão de meu Deus.Dela tenho esta única informação.De mim sei que já vivi o suficiente para saber de muita coisa e o bastante para entender que falta muito por aprender. Até que a Morte diga: Chega!
Direito de ir e vir daqui pra lá e de lá pra cá, não é ser livre... É gaiolar.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Baseado em fatos reais


Determinação

Para o Arnaldo Júnior - gente miuda responsável.
Mais que muitos, rotulados como adultos. 

Angélica é uma capetinha. Com ela nem exorcista pode.
Do Menino Maluquinho, herdou as atitudes. Da mamãe, herdou os grandes olhos para enxergar melhor.
A farta cabeleira vermelha, toda cacheada, acreditem, herdou do papai.
Para não atrapalhar a vista, todo o cabelo é preso por fitas, bichinhos e marias-chiquinhas. As fitas para prendê-lo, não herdou de ninguém. É vovó Alice e a tia Manuela que abastece sua caixinha de enfeites de cabelo. Um trabalho sem fim, porque todo dia ela perde pelo menos duas da mesma cor. O Curupira e o Saci carregam outro tanto. A azul, que prendia um rabo de cavalo, ela tirou e amarrou no rabo do gato. Explicou que antes tentou fazer um coque, no rabo do danado, mas o ga-to-to quase morreu-reu-reu. Se não fosse a Dona Chica....
Do alto de seus seis anos de muitíssima experiência, sabida que ela só, já descobriu que quem não chora, não mama. Que bracinhos cruzados e biquinho de preocupação e arrependimento acalma o papai se, por exemplo, ela enxugar o leite derramado com a gravata preferida dele. A capetinha sabe ser anjo.
O anjo, com o rosto todo salpicado de pintinhas, entre as duas mãos, deitada de bruços, pés balançando pra lá e pra cá , pra esquerda e para a direita, desenhando círculos no ar, folheava um livro, passeando na floresta, seguindo a sapa com laço enorme na cabeça, indo para a festa lá no céu. Encontrou o grande Jacaré. Correu para o colo da mamãe e, para disfarçar o medo, disse para ela que já era hora de ir à escola, porque aprenderia a ler e escrever direitinho umas coisas para aquele boca aberta.
No primeiro dia de aula fez uma revolução na casa. Antes de ir a aula e assim que chegou de lá: olha meu caderno, a tia disse isso, eu fiz aquilo e fiz assado, meu coleguinha chama Samuel, ganhei uma tarefinha, a Aline também é minha coleguinha, uma menininha chorou muito, prega meu desenho na geladeira, lanchei tudinho e a musiquinha do sapo não lava o pé soou pela casa até na hora do banho.
No segundo, terceiro, sexto, vigésimo dia só não era a mesma coisa porque a musiquinha mudava todos os dias. Numa quarta-feira... O bicho pegou. Na escola fez uma revindicação:
              -Quero minha demissão!
A professora corrigiu:
              -Você quer dizer permissão. Para que você quer uma permissão?
              -Não, não. Eu me demito dessa escola. Onde pego meus materiais?
Ela não ia deixar aquela massinha toda, tanta tinta e lápis de cor. Já sabia como ia decorar a parede novinha da sala de casa. A professora fingiu seriedade:
              -Demissão tem de ter explicação.
Angélica tinha aprendido com a bruxa como fazer cara de má. Estava elaborando um feitiço. Mais forte do que o da Bela Adormecida. Fechou a cara. Emburrou. E como um burrinho pedrês, empacou. Veio a Professora que não era a tia, a mamãe e a tia Manuela - tia de verdade e pau-para-toda-obra. A vovó só não veio porque estava na filio...fisino... fisiotera alguma coisa, onde era dobrada e esticada três vezes na semana para ficar novinha.
               -O que você aprontou desta vez, Angélica?
               -Estou é desaprontando! Me demito! Não aguento tanta tarefa! 
         -Mas Angélica, foram só dois exercícios: a tarefa do A e a do O. Justificou-se a professora enquanto a mamãe fazia aquela cara de 'já basta' para a filha e tia Manuela só gargalhava por dentro. Tão por dentro que ninguém de fora via. Nem Angélica que tinha visão mágica.
Com o dedinho em riste, para cima e para baixo, Angélica, hoje, deu a discussão por encerrada:
             -A senhora passou muito mais, hein! Muito mais! Prometendo voltar amanhã só na hora da novidade, porque ela era muito responsável e já tinha combinado de trazer uma coisa bem legal para mostrar aos coleguinhas .

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